Características das cutias e sua importância para a conservação das florestas

Dr Fernando Fernandez • 2 de outubro de 2023

As cutias podem não ser dos animais mais carismáticos de uma floresta, mas são um dos mais importantes. Se as árvores falassem, certamente agradeceriam a elas. Cutias (gênero Dasyprocta, umas onze espécies) são roedores caviomorfos - ou, menos tecnicamente, bichos aparentados às capivaras, pacas, porquinhos-da-índia e similares. 

 

Regiões


Este grupo de roedores é um dos componentes mais característicos da fauna das Américas do Sul e Central, e também dos mais antigos, pois seus ancestrais chegaram aqui há uns 30 milhões de anos atrás, vindos da África. Se você mora no Rio de Janeiro, certamente já viu cutias: há muitas delas no Campo de Santana, em frente à Avenida Presidente Vargas, em pleno centro do Rio.


Hábitos das cutias


Na natureza, as cutias geralmente são diurnas, embora às vezes sejam noturnas. São animais herbívoros, que se alimentam principalmente de frutos, sementes, raízes e algumas folhas. Porém, na Floresta da Tijuca pesquisadores do projeto Refauna já viram uma cutia comendo um coelho nativo, ou tapiti (Sylvilagus brasiliensis). Não é possível saber se ela predou o tapiti, ou apenas se utilizava da carcaça. De qualquer forma, ou ela nunca tinha lido que era uma herbívora e devia se comportar como tal, ou bichos selvagens são mais versáteis e oportunistas do que costumamos acreditar.


Reprodução


Sempre pensamos em roedores como bichos que reproduzem muito, mas os caviomorfos, incluindo a cutia, fogem a esta regra. Elas têm geralmente apenas um ou dois filhotes por ninhada, com até duas ninhadas por ano. Este baixo potencial reprodutivo não as ajuda muito a lidar com as pressões que têm sofrido no mundo atual – das quais a presença de cachorros domésticos soltos em Unidades de Conservação parece ser uma das piores.


 

As "jardineiras da floresta"


As cutias não são animais muito grandes (uns 3 a 4 Kg), mas sua importância para os ecossistemas de florestas tropicais é imensa, desproporcional ao seu modesto tamanho. Não é nenhum exagero dizer que as cutias são as melhores dispersoras de sementes das nossas matas, às vezes chamadas de “jardineiras da floresta”. 


Elas comem frutos muito grandes para um bicho do seu tamanho. Esses frutos tem sementes grandes, de árvores grandes como a cutieira Johannesia princeps e (na Amazônia) a castanheira Bertholletia excelsa, e essas árvores são geralmente as árvores maiores, que caracterizam florestas maduras. As cutias têm o
hábito de comer a polpa dos frutos e, se os recursos são abundantes, enterrar as sementes para consumo posterior – um hábito conhecido como “scatter hoarding”, ou estocagem. 


Outras cutias, porém, procuram ativamente pelas sementes enterradas, as desenterram, e enterram em outro lugar! Deste modo cria-se um balé complexo das sementes sendo movidas de um lugar a outro; uma mesma semente pode ser movida dezenas de vezes! Muitas dessas sementes, claro, acabam perdidas, ou esquecidas, e germinam. Então, cutias são as dispersoras ideais: as sementes são enterradas no chão, em ótimas condições para germinar; são escondidas de predadores; e
são trocadas de lugar favorecendo o fluxo gênico nas populações de plantas. Com tudo isso, são fundamentais para a reprodução das árvores de grande porte, permitindo às florestas manter sua integridade e seu funcionamento. Esses roedores merecem ou não nosso respeito e admiração?


É interessante perguntar porque as cutias dispersam sementes tão grandes para o seu tamanho. Ora, no passado muitas dessas sementes eram dispersadas pela chamada megafauna, ou seja, os grandes animais que havia por aqui até alguns milhares de anos atrás, como preguiças gigantes, toxodontes, mastodontes e cavalos nativos. Todos estes animais foram extintos à medida que a expansão dos humanos modernos pelo planeta foi alcançando toda a América do Sul, entre uns 15 mil e uns 8 mil anos atrás. Os grandes
frutos caídos no chão se tornaram então um recurso subutilizado, e uma ótima oportunidade evolutiva para quem conseguisse alimentar-se deles. As cutias, com seus dentes incisivos muito poderosos e seu hábito de estocar excesso de alimento para consumo posterior, eram bem pré-adaptadas para isso, e assumiram o papel ecológico de dispersoras de muitas sementes que antes teriam sido dispersadas pela megafauna. É por isso que eu as chamo de “megafauna de bolso”.



Quando o projeto Refauna se propôs a restaurar até onde possível a fauna perdida do Parque Nacional da Tijuca, em 2010, a cutia vermelha, Dasyprocta leporina, foi escolhida para ser a primeira espécie a ser reintroduzida. Bom, agora você já sabe por quê.



Texto: Fernando Fernandez (Diretor Presidente do Refauna e Professor da UFRJ)


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A degradação de áreas florestais, por exemplo, contribui para o aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE), enquanto a restauração dessas áreas pode capturar carbono da atmosfera, promovendo o sequestro de carbono. No Brasil, projetos de restauração da Mata Atlântica, um dos biomas mais ricos em biodiversidade, têm apresentado resultados significativos junto de organizações como Pacto pela Restauração da Mata Atlântica e SOS Mata Atlântica. A recuperação dessas áreas não apenas retira CO2 da atmosfera, como também cria um habitat seguro para diversas espécies nativas, muitas das quais ameaçadas de extinção. 2. Agricultura regenerativa A agricultura regenerativa é uma prática que visa restaurar e manter a saúde do solo, reduzir o uso de insumos químicos e promover a biodiversidade local. Ela integra técnicas como o plantio direto, a rotação de culturas e o uso de adubação verde, promovendo uma relação mais equilibrada entre o ser humano e a natureza. Essa forma de cultivo ajuda a mitigar os efeitos das mudanças climáticas ao capturar carbono no solo e melhorar a resiliência das áreas agrícolas a eventos climáticos extremos, como secas e inundações. Países como o Brasil, que possui uma vasta área agrícola, podem se beneficiar amplamente da adoção dessas técnicas, que, além de serem sustentáveis, promovem maior produtividade a longo prazo! 3. Proteção de áreas marinhas Os oceanos desempenham um papel crucial no equilíbrio climático do planeta, absorvendo grande parte do carbono emitido pela queima de combustíveis fósseis. A criação de áreas de proteção marinha (APMs) tem sido uma das soluções mais eficazes para preservar os ecossistemas oceânicos e proteger a biodiversidade marinha. Essas áreas, quando bem geridas, ajudam a preservar espécies marinhas ameaçadas, como corais, peixes e mamíferos aquáticos, ao mesmo tempo que promovem a recuperação dos estoques pesqueiros e mantêm o equilíbrio dos ecossistemas marinhos. Além disso, as APMs contribuem para a mitigação dos impactos das mudanças climáticas, já que os oceanos saudáveis absorvem mais carbono. O Parque Nacional Marinho dos Abrolhos é um excelente exemplo de como as Áreas de Proteção Marinha (APMs) podem ser eficazes na conservação dos ecossistemas marinhos e na proteção da biodiversidade. Localizado no sul da Bahia, esse parque abriga uma das maiores biodiversidades marinhas do Atlântico Sul, incluindo recifes de corais, manguezais, restingas e ilhas oceânicas. 4. Uso de energias renováveis A substituição de fontes de energia fósseis por energias renováveis, como solar, eólica e biomassa, é essencial para reduzir as emissões de GEE e mitigar os impactos das mudanças climáticas. A energia renovável é uma solução sustentável e viável que, além de reduzir a dependência de combustíveis fósseis, contribui para a preservação da biodiversidade ao minimizar o impacto ambiental da geração de energia. Países ao redor do mundo, como a Dinamarca, que já obtém mais de 50% de sua energia de fontes renováveis, mostram que é possível fazer essa transição de forma eficiente. No Brasil, o potencial para a energia solar e eólica é vasto, e investimentos nesse setor são fundamentais para garantir um futuro mais sustentável! 5. Tecnologias de captura de carbono Uma solução inovadora que está ganhando destaque na mitigação das mudanças climáticas é o uso de tecnologias de captura de carbono. Essas tecnologias capturam o CO2 da atmosfera ou diretamente das fontes emissoras, como fábricas e usinas de energia, evitando que ele contribua para o efeito estufa. Embora essas tecnologias ainda estejam em estágio inicial de desenvolvimento e implementação, elas oferecem uma solução promissora para combater as emissões industriais. Algumas empresas e governos ao redor do mundo têm investido na pesquisa e desenvolvimento dessas tecnologias, que podem se tornar parte fundamental da estratégia global de mitigação das mudanças climáticas. A Climeworks, por exemplo, com sede na Suíça, é pioneira na tecnologia de captura direta de ar (DAC), que remove o CO2 diretamente da atmosfera. A empresa desenvolveu grandes coletores de ar que filtram o dióxido de carbono, permitindo seu armazenamento subterrâneo ou utilização em outros processos industriais. A solução cabe ao ser humano As soluções para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e preservar a biodiversidade são diversas e complementares. Desde a restauração de ecossistemas até o uso de energias renováveis e tecnologias de captura de carbono, todas essas iniciativas têm o potencial de reverter parte dos danos já causados e evitar novos impactos no futuro. É fundamental que governos, empresas e cidadãos se engajem na implementação dessas práticas para garantir a sustentabilidade do planeta! Para continuar aprendendo mais sobre como podemos atuar na preservação da biodiversidade e na mitigação das mudanças climáticas, assine nossa newsletter e acompanhe as ações do Instituto Luísa Pinho Sartori. Com você, podemos transformar o futuro do nosso planeta! Não deixe de acompanhar o ILPS nas redes sociais: Instagram | LinkedIn
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